por Eduardo de Rezende
30 de abril de 2019
Muitos pais e educadores se preocupam com o tempo gasto pelas
crianças e adolescentes em jogos eletrônicos. Uma das preocupações tem a ver
com possíveis efeitos negativos nas
relações sociais dessas crianças que passam tempo demais jogando no computador
ou em videogames.
Diversas pesquisas na última década têm identificado uma
diminuição da qualidade das interações
sociais em jovens e crianças e denunciam sua
associação negativa com os games.
Um bom desempenho social
na infância inclui fazer amigos, associar-se a grupos de atividades, respeitar, agir com cooperação e saber regular suas próprias emoções e
comportamentos. Como o desenvolvimento dessas habilidades depende da prática,
que ocorre naturalmente em contextos sociais na interação face a face com
outras pessoas, acredita-se que os jogos eletrônicos não ofereçam oportunidades
para esses aprendizados.
Há outros estudos, entretanto, que mostram justamente o
contrário: há razões para acreditar que jogos eletrônicos podem trazer muitos benefícios para as crianças, uma vez que
esses jogos frequentemente contém uma variedade de desafios cognitivos e muitos
promovem socialização com amigos da vida real ou outros jogadores online,
contribuindo para o desenvolvimento de habilidades sociais.
Em um estudo publicado no último mês, mais de 800 crianças
foram avaliadas entre seus 6 e 12 anos de idade para investigar a associação entre o tempo gasto jogando
games e o desempenho social dessas crianças. A principal pergunta que os
pesquisadores investigaram era se passar tempo demais jogando games causava
prejuízos no desempenho social das crianças.
Essa hipótese inicial de que longos tempos gastos com jogos eletrônicos
trazem prejuízos no desempenho social parece ser verdade apenas para meninas, de acordo com os resultados da
pesquisa. Para os pesquisadores, a justificativa para este fato seria que,
embora meninos passem muito mais tempo jogando, as meninas tendem, muito mais do
que os meninos, a jogar de forma solitária ou em grupos muito pequenos.
Jogos eletrônicos são culturalmente parte integrante da
socialização de meninos, que geralmente compartilham a atividade dentro de grandes grupos de amigos. Meninas que jogam games, por outro lado, não estão em posição social
para o compartilhamento de sua atividade com outras meninas ou meninos. Assim,
meninas gamers tendem a se isolar socialmente e terem menos oportunidades de
praticar habilidades sociais. Isso não quer dizer que toda menina que joga
eletrônicos é isolada socialmente, mas sim que comparando-se estatisticamente meninos
e meninas, as meninas estão muito mais suscetíveis a esse comportamento
solitário.
Além disso, os resultados da pesquisa também mostraram um efeito
contrário à hipótese inicial: ao invés dos jogos eletrônicos levar a um
prejuízo social, é a falta de competência social que leva as crianças a
passarem mais tempo jogando eletrônicos.
Crianças que enfrentam dificuldades em suas vidas sociais
devido a suas limitadas habilidades sociais podem estar mais inclinadas a se
conectar com outras crianças num mundo online, onde a comunicação é facilmente acessível
e parece ser psicologicamente mais segura do que interações face a face. Além
disso, de acordo com Nick Yee, em artigo publicado em 2006 na revista CyberPsychology & Behavior, os
jogos podem servir como um "escape" da realidade e o ambiente digital
é usado para se distanciar dos problemas da vida real.
Obviamente, isso não significa que toda criança que joga games
tem baixo desempenho social, mas que aquelas com baixo desempenho social parecem
gastar mais tempo jogando eletrônicos.
Os autores da pesquisa afirmam que os resultados da pesquisa
diminuem um pouco a preocupação com os efeitos negativos dos jogos eletrônicos
no desenvolvimento social das crianças, uma vez que, de forma geral não foi
encontrada causalidade entre jogar games e ter baixo desempenho social, com exceção
de uma pequena diferença cultural para meninas. Ao contrário do que se pensava
inicialmente, o excesso de tempo gasto com eletrônicos para ser mais um sintoma
do que a causa do baixo desempenho social.
Referências bibliográficas:
HYGEN
et al. Time Spent Gaming and Social
Competence in Children: Reciprocal Effects Across Childhood, Child Development, 00, 0, 1–15, 2019.
YEE,
N. Motivations for Play in Online Games.
CyberPsychology & Behavior, 9(6),
772–775, 2006.